NOTA:
Anota, todas as palavras que são novas para ti. Pesquisa-as, e se continuares com dúvidas, traz para a aula para serem esclarecidas.
TEXTO ADAPTADO DE: Ney Gastal a partir de entrevista com José Lutzenberger
publicada no Jornal RS em janeiro de 1989
"O pulmão consome, e não produz oxigénio,significa que é a Amazónia é uma espécie de fábrica de oxigénio. Mas ela também está incorreta sob outro ponto de vista. Se a floresta, ou qualquer outro ecossistema, produzisse mais oxigénio do que consome, a concentração deste gás na atmosfera terrestre estaria em constante aumento. E isto não acontece. Pelo que sabemos, desde que houve a primeira transformação da atmosfera inicial, que era redutora*, para uma atmosfera oxidante (dois e meio ou três bilhões de anos atrás), os níveis de oxigénio mudaram muito pouco.
A vida surgiu numa atmosfera bem diferente da atual. Não havia oxigénio na atmosfera*. Era uma atmosfera redutora, ou seja, que não oxidava as coisas. Naquele período o ferro não se oxidava, ficava apenas preto. Hoje,o ferro oxida, fica marrom, degrada se. Naquela atmosfera primordial predominavam gases como o metano, o dióxido de cabono e o amoníaco. Quando a vida produziu o fenómeno da fotossíntese, que tem como subproduto o oxigénio, este aos poucos foi oxidando o amoníaco, o dióxido de carbono, o metano, e deu origem a esta atmosfera que temos hoje, com uns 79% de azoto, 20% de oxigénio e apenas um por cento de outros gases. Desde que a fotossíntese transformou aquela primeira atmosfera na segunda, as coisas têm se mantido estáveis durante cerca de dois e meio ou três bilhões de anos. Se não fosse assim, a vida teria acabado há muito tempo.
Se a concentração de oxigénio fosse mais baixa, os animais acabariam por morrer, porque precisam dele para viver. Se fosse mais alta, e em vez de 20% tivéssemos entre 25% e 30% de oxigénio na atmosfera, seria também o fim da Vida na superfície do planeta. Uma concentração destas, permitiria a uma árvore queimar em dia de chuva. O primeiro relâmpago acabaria com todos os ecossistemas. A vida neste planeta é uma coisa bastante equilibrada, que mantém as condições propícias à sua própria existência.
Isto é a base do conceito Gaia.
As florestas tropicais húmidas, que antes da devastação das últimas décadas totalizavam algo como cerca de nove milhões de quilómetros quadrados (mais da metade do continente americano), foram importantíssimas neste processo de manutenção das condições de vida do planeta. Elas não foram o pulmão, como se dizia, e sim uma colossal bomba de calor.
O que é "bomba de calor"?
O congelador e o ar condicionado são bons exemplos. O primeiro tira o calor de seu interior e o dissipa do lado de fora. O ar condicionado pode tanto tirar calor da peça e jogá-lo para fora, quanto tirá-lo de fora e jogá-lo para dentro. A floresta tropical húmida é um colossal aparelho de ar condicionado, que regula a temperatura do planeta.
Um estudante perguntou ao cientista como a floresta tropical húmida sobreviveu à Idade Glacial.
A maioria das pessoas imagina que durante as Idades glaciais, que duraram milhares de anos cada uma (foram quatro), o Planeta inteiro ficou gelado. Nada disso!
O gelo avançou na Europa, na Sibéria, na América do Norte, e um pouco aqui no sul da Argentina e da Austrália. Mas as temperaturas no Equador continuaram as mesmas. No auge dos períodos glaciais, quando o norte da Europa e o Canadá estavam cobertos por dois ou três quilómetros de gelo, as temperaturas nas regiões de Manaus ou Belém eram as mesmas de hoje. Os cinturões tropicais, estes sim, ficaram mais estreitos.
Imaginemos que no lugar da floresta tropical húmida houvesse um Saara. O deserto refletiria a maior parte da energia solar que ali incidisse de volta ara o espaço. Esta energia se perderia para o planeta. Hoje, pelo contrário, existe ali a floresta tropical húmida, que tem uma fantástica evapotranspiração.
O que que dizer isto?
É a soma da evaporação e da transpiração. O professor Salati, climatologista da Universidade de Piracicaba, que aprofundou esta questão, quando estava no INPA (Instituto Nacional de Pesquisas da Amazónia), em Manaus, fez um grande estudo sobre o ciclo da água das chuvas da região. Colhendo amostras e comparando isótopos de hidrogénio e oxigénio, ele podia determinar exatamente de onde vinham as amostras de água da chuva, se do oceano ou de diversos processos de reciclagem. Com estes estudos, ele demonstrou que, das chuvas que caem na Amazónia, cerca de 75% são devolvidas à atmosfera em menos de 48 horas e formam novas chuvas. 25% desta água nem chega até o chão: voltam ao mar, ainda evaporando parte no caminho. Os outros 50% são bombeados pela planta no subsolo para a copa, e devolvidos à atmosfera pela transpiração.
Ao visualizar a floresta amazónica, com o Atlântico a leste e os Andes a oeste vê se que os ventos alíseos trazem as grandes massas de nuvens baixas, a cerca de
Segundo Salati, a energia envolvida neste processo, sobre quase cinco milhões de quilómetros quadrados de floresta, corresponde à energia de dezenas de milhares de bombas atómicas por dia! Isto é uma gigantesca máquina de transmissão de energia.
Hoje existem instrumentos fantásticos, que nos permitem ver o globo em sua totalidade. Se formos ao INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais),
Nesses monitores vemos que, ao chegarem aos Andes, estas massas de ar dividem se em duas correntes. Uma vai para o Sul, atravessando toda a parte central do Brasil, chegando até aqui e entrando Patagónia adentro. O clima no Sul do Brasil depende muito da Amazónia. A outra corrente vai para o Norte. Toca a costa oriental dos Estados Unidos e entra até a Escandinávia e Europa Central.
Nestas imagens vê se quanto o clima da Europa, Sibéria e aqui da América do Sul depende em grande parte da Amazónia. Desde que temos esta visão global do Planeta, ficou bem clara a importância da Amazónia, e de todas as outras florestas equatoriais húmidas que ainda restam para a regulagem do clima mundial. Ao mesmo tempo que fica cada vez mais clara a fragilidade do todo o processo.
Nestes últimos congressos sobre clima, em Toronto e Hamburgo, onde se reuniram centenas de climatólogos de todo o mundo, todos reconheceram que as irregularidades climáticas que estão a afetar o planeta inteiro. Nestes últimos dez ou quinze anos as primeiras manifestações do efeito estufa, provocado pela civilização industrial. são a prova disso. Mas os cientistas continuam a não relacionar os dados do passado. Uma vez que o efeito estufa está a aumentar, elevando a temperatura do Planeta, eles extrapolam a situação atual e afirmam que, nos próximos 40 ou 50 anos, a Terra vai ficar de quatro a cinco graus mais quente. Mas por que supor que o aumento será uniforme em todo o Planeta?
O homem deve mudar os métodos agrícolas para que eles não prejudiquem ainda mais o clima global, ele preocupa se apenas em adequar a agricultura a estas mudanças. Em certos sítios será impossível plantar o trigo quando o planeta estiver mais quente.
Desde 1970 os climatólogos vêm advertindo sobre os riscos dos gases freón, dizendo que os mesmos estavam atacando a camada de ozóno. Calculavam o desgaste da mesma em 30% ou 40%, até o ano 2020. Só que previam uma diminuição gradual, lenta e uniforme sobre o planeta inteiro. Na realidade o que aconteceu, foi que abriu um buraco na camada de ozóno sobre a Antártida. Este tipo de efeito é totalmente imprevisível! Só se toma conhecimento dele quando acontece. Ninguém previu que se abriria um buraco na camada de ozóno, tanto que, quando ele foi detectado, os cientistas chegaram a pensar que se tratava de defeito na programação de seus computadores, e não de uma realidade concreta. Outro exemplo, aconteceu na costa do Peru, há uns dez anos atrás, acabando com a indústria pesqueira do país. Aquela era uma das costas mais ricas em peixe do mundo. Nela batiam as águas frias da Corrente de Humbolt, que vem do Pólo Sul trazendo nutrientes minerais, que provocam o desenvolvimento de plâncton*1 que, por sua vez, resulta no aumento da população de peixes. De repente, uma corrente quente do Norte, e pobre em nutrientes, em vez de virar para oeste, como fazia sempre, seguiu para o sul e deslocou a Corrente de Humbolt uns
Vou dar um exemplo mais antigo. Na Sibéria e nos países escandinavos foram encontrados corpos inteiros, intactos, de mamutes congelados. O mamute era um parente próximo do elefante, duas vezes maior do que este, que vivia naquelas regiões. Como é que estes mamutes foram enterrados nestas enormes capas de gelo? Bichos daquele tamanho não comiam líquens como os que nascem em terrenos frios da Trunda. Precisavam de pelo menos meia tonelada de comida verde por dia. Como foram ficar congelados na neve? Só mesmo se tivessem sido surpreendidos por uma violenta e inesperada tempestade de neve que caiu sobre eles cobrindo-os, e ficando ali, na forma de gelo, por milhares e milhares de anos. Sabemos que as eras glaciais podem levar dezenas, ou até milhares de anos para acabar. A Amazónia não é só nossa. É do Planeta inteiro, um órgão vital do ser vivo chamado Gaia, que é a Terra. Não podemos continuar destruindo a Amazónia. É preciso parar. É preciso repensar conceitos. "
NOTA: Atenção para o facto do autor ser Brasileiro. Assim, tens de ter em atenção os temos que estão escritos no português usados no Brasil.
*1 microorganismos marinhos que flutuam nas águas....